Embrulhado em saco de pão

Não sei onde eu estava com a cabeça quando resolvi te dar meu coração de presente, embrulhado num papel de pão amassado, pois era a única coisa que tinha em mãos. A urgência percorreu meu corpo e, impetuosa, arranquei o coração, embrulhei de qualquer jeito e te entreguei. Assim, do nada.

Sei que deveria ter esperado um momento mais oportuno e, talvez, embrulhado com mais zelo em papel de presente multicolorido, com algum laço de fita bonito. Na hora pareceu tão certo te dar meu coração, que não liguei para o farelo de pão que ainda tinha no fundo do pacote: o importante é o gesto, certo?

Lembro bem dos teus olhos arregalados, segurando aquele saco de pão pulsante como se fosse uma bomba caseira. Você sorriu amarelo, tentando disfarçar o que tua íris gritava: você não estava preparado para cuidar daquilo. Fiquei com medo, confesso. Sei lá, foi um tanto desesperador te ver com meu coração nas mãos e não saber o que fazer com ele.

No instante em que te presenteei parecia tão certo! Tu tinhas me abraçado daquele jeito que só tu sabes fazer e me encaixei com aquela perfeição de quebra-cabeça novo. Quando você sorriu o meu sorriso, aquele que te deixa com os olhos minúsculos, peguei o saco de pão, botei meu coração dentro e tó, toma que é teu, achando ser a coisa mais bonita e certa a se fazer naquele momento.

Mas quando tuas mãos tremeram ao segurar o pacote, bateu uma insegurançazinha no meu peito oco e formou um vinco na testa de que foi que fiz? Fiquei vazia, sabe? Depois que te dei o meu melhor de presente, sobrou muito espaço aqui dentro e concluí, tristemente, que eu esperava que você me desse seu coração em troca, como se para retribuir o presente megalindo (eu acho, pelo menos) que te dei, embrulhado num saco pardo, velho e amassado de pão.

Você não precisaria embrulhar, eu entenderia. Só que você não me deu teu coração desembrulhado e eu fiquei com mó vergonha de pedir o meu de volta. Presenteou, tá presenteado, certo? Então fiquei com a esperançazinha de que você me devolvesse ele, com aquele papo altruísta de gente do bem e tal e coisa: ô, legal… Mas não posso aceitar, pode ficar com você e toda essa lenga-lenga, mas você também não o fez.

Posso falar a verdade? Fiquei com mó medo.

Pô, era eu ali naquele saco de pão. Podia ser só um pedacinho, mas era meu melhor pedaço e dei pra ti sem rodeios e você ficou segurando com as mãos trêmulas, esperando que a coisa toda explodisse, sei lá. Já pensou se você deixasse cair no chão e meu coração se espatifasse em sei lá quantos pedaços? Fiquei com medo.

Fiquei com medo que fosse doer demais. Fiquei amuada, sabe? Quase que quis dar as costas e ir embora, mas como que se vai embora depois de dar o coração na mão de uma pessoa e quase parafrasear Caio F, toma, faz o que quiser com ele? Não tenho sangue frio a ponto de deixar o melhor de mim para trás não. Não combina comigo, então fiquei.

Acho que esses pensamentos todos não duraram um minuto, foi só o tempo de você tremer as mãos, arregalar os olhos e, ufa!, por fim sorrir daquele jeito que deixa teu olho pequenininho, botando o meu coração dentro do teu peito, para pulsar junto com o teu. Lado a lado. Esquentando um ao outro, pulsando no mesmo ritmo.

Sensato, rapaz. Eu sou desastrada demais.



LIVRO NOVO



Engenheira, blogueira, escritora e romântica incorrigível. É geminiana, exagerada e curiosa. Sonha abraçar o mundo e se espalhar por aí. Nascida e crescida no litoral catarinense, não nega a paixão pela praia, pelo sol e frutos do mar.

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