“Foi mal!” Estratégias infantis para escapar das responsabilidades!

Imagem de capa: JPagetRFPhotos, Shutterstock

Alegar ignorância sobre o que quer que seja não pode servir como desculpa para atitudes movidas por desvio de caráter. Caráter é aquilo que forja a essência da pessoa. Diante de uma situação de afronta aos direitos alheios; à proteção à vida; à garantia da liberdade e à defesa da equidade, acende dentro de nós uma luz vermelha; faz soar em nossas consciências um alerta: ISSO NÃO É CERTO! ESSA ATITUDE É DESLEAL! ESSA CONDUTA É DESONESTA! ESSA POSTURA É DESUMANA!

Nossas ações, mesmo as mais singelas ou despretensiosas, revelam muito sobre nós. Ao cruzarmos no caminho com um semelhante tombado por seus erros, numa dessas esquinas quaisquer da vida e, imediatamente, realizarmos um julgamento, deveríamos nos preocupar bastante com o risco da queda. Visto que nenhum de nós está livre de falhar ou de falir, deveríamos ser capazes de olhar para os tombos alheios com um tantinho a mais de coragem para esticar a mão e um punhado a menos de tranquilidade para torcer o nariz e ser tão complacente com os próprios erros.

A desgraça alheia nos assusta, como se fosse uma doença contagiosa. Somos tão despreparadas para trilhar desvios, que escolhemos, sem pestanejar o caminho mais óbvio, confortável e que esteja em sintonia com o que pregam aqueles de nós que parecem ter nascido “com o traseiro virado para lua”! Ainda que o tal caminho nos aprisione num congestionamento de ideias pré-concebidas, é por ele que escolheremos caminhar.

Somos seres estranhos, capazes de nos aventurar em estradas abarrotadas rumo a destinos descolados, onde seremos exorcizados de uma carga de insatisfação, advinda da rotina de um trabalho insano e sem ideal. Carga essa que topamos encarar porque o sacrifício há de nos garantir um punhado a mais de coisas que consumimos vorazmente, na tentativa ridícula de aplacar uma sede que nenhuma coisa consumível é capaz de saciar. E, nos apegamos a essa exaustão emocional como desculpa esfarrapada para justificar todos, ou grande parte, dos nossos erros.

A parte complicada dessa engrenagem é que nada nos sacia! A sede, que não cede, faz de nós criaturas incapazes de enxergar os tantos que deixamos para trás de nós, atropelados por nossa infinita carência de tudo. E quando, por algum descuido tomamos a ousada decisão de olhar para o outro que inadvertidamente derrubamos, é com uma surpreendente facilidade que acreditamos que nossas desculpas merecem imediata aceitação. Efeito automático! Proferimos um sonoro “Foi mal” e nos distanciamos imediatamente do estrago feito.

O fato é que despido de qualquer tipo de retratação, um pedido de desculpa chega a soar ofensivo. É a inequívoca confirmação da falta de compromisso e de respeito em relação a tudo que advém como consequência de uma falta nossa. Um pouco de disposição para ir além das aparências (das nossas, inclusive!), não nos faria mal algum. Imagine que revolucionário seria se a partir de agora, decidíssemos assumir que os outros merecem de nós alguma consideração; e além dela, o nosso genuíno esforço na intenção de reparar os estragos que fazemos.

Afinal, já que sai tão facilmente de nossas bocas o argumento de que “errar é humano”, que fosse incluída na categoria das humanidades, a capacidade de entender que há erros que modificam inúmeras existências ao nosso redor; que há erros que destroem irremediavelmente os sonhos alheios; que há erros que são indeléveis; que há erros que de tão definitivos nos atrelam para sempre às vidas daqueles a quem prejudicamos.

E, sim, é verdade que nenhum de nós está protegido de errar. É da nossa natureza! Também, é bem verdade que, não raras vezes, tropeçamos em nossos enganos de forma absolutamente acidental. Erramos sem querer errar. Também isso é da nossa natureza!

O que parece não fazer parte afinal, da nossa natureza é a gentil delicadeza de nos ver responsáveis pelos danos que causamos. O que precisa começar a compor a nossa forma de agir é alguma coisa mais inteira e mais próxima de nos tornar pessoas em quem se possa acreditar. Que brote dentro de cada um de nós uma força apaixonada que nos tire dessa postura mimada e medíocre, que nos faz acreditar que não importa o que façamos, sempre daremos um jeito de nos livrar da responsabilidade de reparar os estragos. Que em vez da culpa, esse sentimento inútil que reduz tudo a uma autoimolação e piedade de si mesmo, surja em nosso peito uma bravura que nos torne capazes de transformar um tosco pedido de desculpas numa mão estendida e firme na qual o outro possa, de fato, confiar.



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"Ana Macarini é Psicopedagoga e Mestre em Disfunções de Leitura e Escrita. Acredita que todas as palavras têm vida e, exatamente por isso, possuem a capacidade mágica de serem ressignificadas a partir dos olhos de quem as lê!"

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