Às vezes a gente pensa que as pessoas são como livros numa estante. Que não importa que os anos passem. Que elas vão permanecer no mesmo lugar pra quando a gente precisar. Existem os livros que vemos sempre. Que estamos sempre consultando. Que sabemos algumas páginas de cor. E existem aqueles que a gente sabe que tem, mas que não pega pra dar uma lida faz tempo. Que não visita. Que não liga pra saber se tá tudo bem com a desculpa sincera de que não tem mais tempo. Eu tenho uma pilha de livros que eu queria ter. Eu tenho uma pilha de livros empoeirados. Eu tenho uma pilha de livros que eu nunca abri pra ver o que tinha dentro por mais que eles tivessem ao meu lado. Eu tenho uma pilha de livros que eu acho que eu não quero mais. Eu ando aflita por uma estante. Porque se tem uma coisa que um livro merece ter na vida além da atenção silenciosa dos nossos olhos deslumbrados é uma estante. Um local decente pra eles terem razão de ser. Para que fiquem acessíveis. Para que nos pertençam sempre. Porque têm livros que eu até esqueço que tenho e quando os encontro é como se fosse a primeira vez. Reler os mesmos livros às vezes é bom, mas não tanto como se deixar encantar por uma nova história mais uma vez. Por uma capa mais brilhante. Verniz que brilha de longe convidando pro toque da proximidade. Hoje falta um livro na minha estante inventada. Um exemplar raro e belo que fazia anos que não era visitado e que agora foi pra uma biblioteca onde ele sempre mereceu estar e que por ora eu não tenho acesso. É estranho quando a gente perde as coisas, por mais que elas estejam distantes. E isso me fez pensar até que ponto somos eternos. Até quando alguém deixa de ser um livro na estante pra se tornar uma lembrança aquarelada de um tempo remoto onde os livros que leio hoje ainda nem eram nascidos.

(.Livros.) – Alice Venturi

Alice Venturi

“Burila as palavras com a maestria de quem enxerga as veredas do ser como pontos de passagem, onde tudo é passível de transformação. Os sentimentos se entrelaçam, vão da risada escancarada à mágoa que mancha as horas com um encardido que não sai fácil. As palavras dela não saem fácil da gente, perpetuam-se nos recônditos espaços, proliferam sentidos e criam raízes fundas. A “Palavra” que estilhaça e esfuzia sentidos é a mesma que embala e cura a alma das mazelas cotidianas. Chega para sublinhar a sofisticação do simples, para propor o jogo poético das imagens que se entrelaçam desvelando tudo que vibra e faz vibrar. Fotógrafa, poeta, produtora artística e professora são algumas das nuances dessa carioca de alma furta-cor que vive suscitando diálogos entre os diversos campos artísticos e convocando à emoção, ao delírio ─ ao voo. Formada em História da Arte pela UERJ, Alice tem um livro publicado, “As Maravilhas do País de Alice”, pela Scortecci Editora, 2008”. Ester Chaves

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Alice Venturi
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