O dia que escolhi te deixar

Por Francisco Gracioli

Eu custei até que saísse da minha boca um “eu te amo” honesto. Não queria que fosse só mais uma paixão vaga da minha vida que vai embora assim de repente. Recuso relações que tenham prazo de validade. Tenho problemas em criar laços com tempo marcado para desatarem. Eu fui duro e fui contra me vincular contigo até o último minuto, mas quando me dei conta já estava tomado pelo vírus de quem quer namorar, casar, ter filhos e dividir a mesma cama.

De alguma forma, eu aprendi a amar você. Desde o seu pior defeito até a melhor qualidade, repito: eu aprendi a te amar. Desenvolvi um desejo de tê-lo como companheiro, de compartilhar tudo: tristezas e felicidades. Queria apresentar aos meus amigos. Ao meu pai. Às minhas irmãs. Porque isso é amor. Queria que os encontros fossem intermináveis. Quando te abraço, guardo o teu cheiro para que possa dormir contigo no pensamento. Queria que fosse eterno. Porque você me acalma.

Mas, de uns tempos pra cá, parece que está ao contrário. Esse amor não deve estar certo. Percebo que estou amando alguém que só “gosta” de mim. A ficha caiu e me derrubou. Não sei o que tô sentindo agora porque tem uma confusão passando no meu coração. Se a gente acabasse, o que seria de mim? Não sei. Só queria que você sentisse o mesmo, mas não é desse jeito que funciona o jogo do amor. É preciso ter sorte para achar o correspondente adequado. E eu, ora, eu não sou Deus nem feiticeiro pra te trazer em sete dias. No fundo, sinto que algo ruim vai acontecer.

Tirar você da minha vida é algo que abomino, mas como deixar continuar um relacionamento que talvez nunca ande aos meus passos? Não estamos num mesmo coeficiente. Eu amo você racionalmente pelo menino que é. Mas irracionalmente porque tem uma força absurda que se alimenta do seu carinho. Infelizmente, a recíproca nunca foi verdadeira. Cedi ao mal das paixões que passei a vida fugindo, mas quebrei a cara – como se só fosse ela que saiu despedaçada. Deveria ter duvidado: os contos de fada servem apenas para criar esperança. Eu te colocava nos meus sonhos, mas – na realidade – você nunca esteve lá. Criei planos que agora vão para a máquina de reciclagem das memórias que não apareceram.

Foi um dos dias mais longos da minha vida. A manhã durou uma eternidade, a tarde parecia não acabar nunca, e a noite nem chegou a existir. Enquanto os minutos (não) passam, meu pé esquerdo não para de bater no chão, num ritmo doentio que simula a bagunça da minha alma. Já levantei, comi, deitei, comi de novo e até virei o ventilador para a minha cara porque mamãe dizia que um vento refresca o espírito. Mentirosa! Fui na cozinha e abri a geladeira só pra pensar. Mas não pensei em nada além daquele arzinho gelado que saía do freezer. Queria era gelar o coração. Fechei a geladeira. Andei um pouco pela casa e voltei para a cozinha. Abri de novo aquele trambolho branco. Vi que a luz ligava e desligava automaticamente. Fiquei abrindo e fechando só pra me distrair. Voltei pra cama. Desbloqueei o celular. Abri as mensagens e fui direto na aba da conversa dele. “Amor”, e um toque na tela. “Online”: confesso não haver nada mais angustiante do que essa informação desnecessária. Abri a foto dele e caíram uma ou duas lágrimas. Fechei a foto. Dedos no teclado. Queria puxar qualquer assunto, só para que tivesse alguma resposta boba. Ora, já estava com saudade… Digitei. Apaguei. Digitei. Apaguei. Digitei. Apaguei. Fechei tudo e rezei para que chegasse uma notificação.

“Trim! Trim!”

Por um momento, tudo parou.

Que alegria!

Mas não era ele.

Que tristeza!

Droga. Voltei para o meu mundinho de ansiedade. E a perna, coitada, toda se tremendo. Unhas? Nem tente me pedir para parar de roer numa hora dessas. O problema é que preciso de um pouco de tempo para conversar, mas ele sempre está surdo para as minhas lamentações. Não é um relacionamento. Não há casal que se sustente no silêncio absoluto e que compense o contato físico com a simulação de amores com emojis no WhatsApp. Não dá. Esse amor é incompatível porque escrevi uma história que só existe na minha ficção. Preciso de alguém que me ame à mesma medida. Meu amor não pode valer por nós dois. E eu, que tento prever os acontecimentos, esqueci de antever o fim. O nosso fim. Porque cansei de me doar e receber migalhas. Cansei de sofrer assim.

Refleti. Chorei. Fui para o banheiro, escondido. Tirei a roupa e entrei no box. Chorei mais. Abri o chuveiro para descarregar as dores. Fingi que meu rosto estava encharcado por causa da ducha. Não importa… Desceu tudo pelo ralo.

Agora, são águas passadas.

Assim como o meu amor por você.

Para ler mais do autor acesse Obvious – Estadiário



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Blog oficial da escritora Fabíola Simões que, em 2015, publicou seu primeiro livro: "A Soma de todos Afetos".

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