Para o amor que virá depois do cara errado

Certamente eu não te notarei quando se aproximar de mim, estarei ocupada demais buscando curar minhas feridas. Eu me enganei ao amar alguém que nunca se importou comigo e agora estou juntando os cacos de mim.

Quando me vir passar por você, não me culpe pela falta de jeito, pela falta de uma animação exagerada, pelo cabelo preso de qualquer maneira. Eu amei demais e deixei que roubassem o meu sorriso. Eu amei demais, me doei demais e acreditei em um caminho que não dava em lugar algum.

Eu tentei caber em um vestido PP, mas meu número é G. Eu tentei gostar de cerveja, mas o que aprecio mesmo é margarita, eu tentei alisar o cabelo, mas o meu é lindamente enrolado, eu tentei amar Marcelo Rubens Paiva, mas estou mais para Rosamunde Pilcher.

Me perdoe amor pela minha falta de jeito, por ser míope e te confundir de forma tão leviana. Enxerguei o relacionamento passado com minha parte mais otimista e não demorou muito para que eu me visse nua, desnuda de meus anseios, diminuída em minhas capacidades, pobre em minhas aspirações. Eu deixei que um outro se apoderasse de mim sem piedade, não protegi minha integridade e agora assim estou.

O telefone toca, contudo nem sempre o atendo, a vida chama, mas há em mim um receio em novamente errar, mas não desista de mim. Não desista do que ficou, não desista de enxergar aquela que mesmo destroçada encontrou forças para lutar e afastar de si uma pessoa incapaz de compartilhar o melhor, incapaz de despertar o melhor.

Não desista dessa que aqui está, descalça, com marcas de uma luta que marcou o fim de um relacionamento sofrido. Não desista dessa que pode não ter hoje a alegria de ontem, que entende que errou, mas que mesmo assim encontrou forças, sabe-se lá de onde, para mudar as coisas.

Amor, quando colocar seus olhos sobre mim, seja ponderado e respeitoso, seja carinhoso e gentil. Aqui em sua frente está uma pessoa que acreditou que ia para o paraíso dos deleites românticos, mas que na verdade partiu desprevenida para uma guerra silenciosa.

Todos os dias eu me convenço que não me cabe a culpa, todos os dias eu busco ensinar-me novamente a acreditar. Estou reaprendendo a viver, estou sendo o melhor de mim, mesmo sem os pedaços que me foram arrancados no passado.

Depois do fim, depois da lama e dos destroços, achei que não conseguiria novamente levantar, mas estou andando pelo mundo, ainda que devagar. A vida insiste e mesmo que a vontade por vezes falte, ela tem sido suficiente para me embalar nesses dias que hoje são singelos e simples, contudo repletos de pequenas descobertas.

Agora eu arrisco sair de casa sem preocupações ansiosas, arrisco encontrar velhos amigos sem avisos prévios, arrisco comprar as mais belas flores para presentear a mim e enfeitar minha pequena casa. Hoje eu ouso ouvir os discos antigos que ficaram guardados por anos e cantarolar minhas canções favoritas sem receios. Hoje eu tomo banhos demorados e visto qualquer coisa, sem a obrigação de ser o que não sou.

Hoje eu me acho perfeitamente normal dentro de minhas loucurinhas saudáveis. Hoje eu como chocolate na hora que tenho vontade e assisto às minhas comédias românticas sem protelá-las em prol de algum besteirol americano que não me apetece.

Estou me acostumando a ser só. A sensação é como aquela que sentimos quando colocamos os pés em uma água estupidamente gelada, mas que com o tempo torna-se inacreditavelmente agradável. Estou achando minha companhia surpreendentemente boa. Tão boa que preciso te pedir que não permita que eu me feche em mim e perca assim a chance de me apaixonar e amar verdadeiramente no futuro.

Estou ensaiando alguns passos para uma dança inédita. Estou dando pulinhos desajeitados buscando me encontrar. E eu desejo que você esteja perto o suficiente para quando me vir embalada por essa inusitada dança me puxar pela mão e me aninhar em seu peito em uma dança de dois.

E que você não precise de palavras para me convencer de sua verdade. Que o teu abraço acalente meu coração acalmando-o com seu toque sereno. Que o seu olhar revele o melhor de você em mim e que o melhor de mim floresça em você. Que possamos dividir animados a mesma tragada de ar e que juntos tenhamos fôlego para mergulhar em nós, bem fundo, tocando as profundezas ainda intocadas do nosso eu.

Que nós possamos reconstruir as ruínas da confiança que nos habita, que nós possamos nos desvendar como enigmas, que nós possamos nos aventurar pela imensidão de possibilidades lindas que moram dentro do verdadeiro amor.

Acompanhe a autora no Facebook em Vanelli Doratioto – Alcova Moderna

(texto de ficção – imagem de capa: Shutterstock )



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Vanelli Doratioto é especialista em Neurociências e Comportamento. Escritora paulista, amante de museus, livros e pinturas que se deixa encantar facilmente pelo que há de mais genuíno nas pessoas. Ela acredita que palavras são mágicas, que através delas pode trazer pessoas, conceitos e lugares para bem pertinho do coração.

11 COMENTÁRIOS

  1. Excelente texto. Quem já passou por situações semelhantes as sitadas , entenderão. è melhor ainda pq na doída verdade dos dias vagarosos, estamos vivos e mesmo que com pouca … temos fé que dias melhores virão! pq a ilusão de antes era como areia movediça, pra qual caminhávamos lentamente .

  2. estou vivendo um pouco seu texto…mas nao creio que se dara o mesmo final ecreveu…bem que queria mas é complicado…litrealmente ainda em cacos o meu coraçao…mas é muito lindo oque escreveu…parabens

  3. Parabéns Vanelli É bem isso! É a realidade de alguns corajosos, sim é necessário reunir muita coragem para se jogar nessa água gelada, principalmente quando não se sabe a profundidade na qual está se atirando. Eu me joguei de olhos fechados e a água? Foi gelada valendo! Me curei de uma doença que não me pertencia e hoje? Rsrs. Tenho um imenso orgulho de mim, de minha coragem, da capacidade de suportar a água gelada, morri, renasci muito melhor.
    De tudo e por tudo valeu para mim, para meus filhos, para minha família, para meus amigos e quem sabe, para alguém que eu nem conheça, que, em busca de coragem, possa ter conhecimento de minha realidade e que não se contente de um dia ser lembrado como alguém que apenas desistiu de viver.

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