Não existe criança difícil, difícil é ser criança em um mundo de pessoas cansadas

Por Raquel Brito

Não existe criança difícil, o difícil é ser criança em um mundo de pessoas cansadas, ocupadas, sem paciência e com pressa. Existem pais, professores e tutores que se esquecem de um dos compromissos mais importantes da educação de uma criança: o de oferecer aventuras infantis.

Este é um problema tão real que, por vezes, podemos ficar preocupados pelo simples fato de uma criança ser inquieta, barulhenta, alegre, emotiva e enérgica. Há pais e profissionais que não querem crianças, querem robôs.

O normal é que uma criança corra, voe, grite, experimente, e faça do seu ambiente um parque de diversões. O normal é que uma criança, pelo menos nas idades prematuras, se mostre como ela é, e não como os adultos querem que ela seja.

Mas para conseguir isso, é importante entender duas coisas fundamentais:

  • A agitação não é uma doença: queremos um autocontrole que nem a a natureza nem a sociedade fomenta.
  • Fazemos uma favor às crianças se as deixarmos ficar aborrecidas e evitarmos a superestimulação.

Doenças? Medicação para as crianças? Por quê?

Mesmo estando muito na moda no setor de saúde e escolar, a verdadeira existência do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é muito questionável, pelo menos da forma exata como está concebido. Atualmente considera-se que este transtorno é uma caixa onde se amontoam casos diversos, que vão desde problemas neurológicos até problemas de comportamento ou de falta de recursos e habilidades para encarar o dia a dia.

As estatísticas são esmagadoras. Segundo dados do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais IV- TR (DSM-IV TR), a prevalência do TDAH nas crianças é de 3 a 7 casos por cada 100 meninos e meninas. O que preocupa é que a hipótese biológica subjacente a isto é simplesmente isso, uma hipótese que é comprovada por ensaio e erro com raciocínios que começam por “parece que isto ocorre porque…“.

Enquanto isso, estamos supermedicando as crianças que vivem conosco porque elas mostram comportamentos perturbadores, porque não nos mostram atenção e porque parecem não pensar quando realizam as suas tarefas. É um tema delicado, por isso temos que ser devidamente cautelosos e responsáveis, consultando bons psiquiatras e psicólogos infantis. 

Partindo desta base, devemos destacar que não existe um exame clínico nem psicológico que determine de forma objetiva a existência do TDAH. Sem dúvida os exames são realizados com base em impressões e realização de provas distintas. O diagnóstico é determinado com base no momento em que são realizadas e na impressão subjetiva destas provas. Inquietante, não é?

Não podemos esquecer que estamos medicando as crianças com anfetaminas, antipsicóticos e ansiolíticos, os quais podem causar consequências nefastas no desenvolvimento neurológico delas. Não sabemos qual vai ser a repercussão deste medicamento e muito menos do uso excessivo do mesmo. Um medicamento que apenas vai reduzir a sintomatologia, mas que não reverte de forma alguma o problema.

Parece uma selvageria, mas… Por que isso continua? Provavelmente um dos motivos é o financeiro, pois a indústria farmacêutica move bilhões graças ao tratamento farmacológico administrado às crianças. Por outro lado está a filosofia do “melhor isto do que nada”. O autoengano da pílula da felicidade é um fator comum em muitas patologias.

Deixando de lado rótulos e diagnósticos que, na proporção em que se dão, tornam-se questionáveis, devemos colocar os freios e ter consciência de que muitas vezes os que estão doentes são os adultos, e que o principal sintoma é a má gestão das políticas educativas e das escolas.

Cada vez mais especialistas estão tomando consciência disto e procuram impor restrições a pais e a profissionais que sentem a necessidade de colocar a etiqueta de TDAH em problemas que, muitas vezes, provêm principalmente do meio familiar e da falta de oportunidades dadas à criança para desenvolver as suas capacidades.

Como afirma Marino Pérez Álvarez, especialista em Psicologia Clínica e professor de Psicopatologia e Técnicas de Intervenção na Universidade de Oviedo, o TDAH nada mais é que um rótulo para comportamentos problemáticos de crianças que não têm uma base científica neurológica sólida como é regularmente apresentada. Ele existe como um rótulo infeliz que engloba problemas ou aspetos incômodos que efetivamente estão dentro da normalidade.

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“Não existe. O TDAH é um diagnóstico que carece de identidade clínica, e a medicação, longe de ser propriamente um tratamento, é na realidade doping”, afirma Marino. Generalizou-se a ideia de que o desequilíbrio neurológico é a causa de vários problemas, mas não há certeza de que ele seja causa ou consequência. Isto é, os desequilíbrios neuroquímicos também podem ser gerados na relação com o que rodeia a criança.
Ou seja, a pergunta adequada é a seguinte: o TDAH é ciência ou ideologia? Convém sermos críticos e olharmos para um mundo que fomenta o cerebrocentrismo e que procura as causas materiais de tudo sem parar para pensar sobre o que é a causa e o que é a consequência.
Partindo desta base, deveríamos pensar em quais são as necessidades e quais são os pontos fortes de cada criança e de cada adulto suscetível a ser diagnosticado. Abordar isto de maneira individual proporcionará mais saúde e bem-estar, tanto dos pequenos como da sociedade em geral. Então, a primeira coisa que devemos fazer é uma análise crítica de nós mesmos.

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13 COMENTÁRIOS

  1. Excelente texto. Sempre que algo “anormal” ocorre com crianças e adolescentes, inicia-se uma maratona de saber o que acontece… chegamos a conclusão que os pais, o ambiente, os tutores, os adultos, são os responsáveis. Infelizmemente! E aí querem cuidar das crianças… E quem precisa se cuidar verdadeiramente são os adultos…

  2. Se não existem crianças hiperativas, me digam então o que é uma criança que dorme 3 horas por noite, que passa o dia a falar sem parar calada, durante 3 segundos, que está em constante movimento, mesmo sentado ( que não dura mais que dois minutos) , tendo que estar sempre a mexer as mãos, os pés, o corpo? O que é uma criança que tem crises de ansiedade, quando tem que esperar por algo e que tem ataques de pânico e que não vai à wc sózinho por medo do escuro, que não quer dormir sózinho por medo dos homens maus, que não quer sair de casa, que não gosta da escola porque fazem muito barulho, que não tem amigos porque diz que os meninos não sabem brincar? Ele apenas diz que a culpa não é dele.É a cabeça dele.

    • Tenho uma filha TDAH, tipo desatenta. O que eu digo é acompanhem casos de crianças TDAH antes de escrever sobre o TDAH. As doenças “invisíveis” sofrem muito preconceito e os acometidos por ela muito mais. Que alento dar para estes pais?

  3. O texto bacana. Porém não vamos generalizar. Criança é assim mesmo. Precisa ter estes momentos. “Ser criança”. Brincar, correr, gritar…portanto é necessário impor limites. Não tem que deixar fazer tudo o que quer. Isso depende do ambiente, do espaço e da hora. Ela precisa de limite SIM. Se não irá achar que tem que gritar e correr dentro de um restaurante ou uma igreja. E se disser não começa as pirraças. Não é o adulto que tem que obedecer a criança e sim a criança que deve obediência ao adulto responsável por ela. E eu concordo que o adulto responsável pela criança, seja a família ou professor’, precisa propiciar estes momentos para a criança não se deve privá-la de ser criança. Porém a criança deve entender que existe tempo e lugar para tudo.
    Discordo que a criança deva ser o centro de tudo numa escola ou família e dai deixar ela fazer tudo que deseja…

  4. Acredito que nao podemos estigmatizar às crianças, nem obriga- las a ser como gostariamos que fosse. Cada sujeito tem suas subjetividades, cabe aos pais principalmente e a escola conhecer esse sujeito de maneira integral, somos o produto acabado daquilo que produzimos. O lugar onde vivemos diz muito da historia de cada um, a família diz tudo sobre nossos atos e omissões. Concordo muito que nao devemos medicar uma criança para que ela obedeça e permaneça estática para nao nos incomodar ou perturbar, pois como foi citado anteriomente há limites e regras que devem ser impostas desde bem pequenos. Uma vez que eles precisam aprender nao apenas conteúdos didáticos para se profissionalizar para o trabalho, mas aprender valores fundamentais para toda vida.

  5. Apesar de ser um texto bacana, é preciso tomar muito cuidado ao tentar afirmar que o TDAH é uma ideologia.
    O TDAH é um distúrbio real, que afeta pessoas no mundo real e é preciso analisar cada caso de forma individual,
    Concordo com vários pontos do texto, como por exemplo, a necessidade de se tomar cuidado na hora de diagnosticar, analisando cada pessoa, seja ela criança ou adulta, de forma individual, porém o achei um pouco irresponsável ao banalizar, talvez de forma desintencional, a seriedade do TDAH.

  6. tdah e coisa seria e deve ser cuidada, hoje existe pais e maes e profissionais, (generalizando tudo muitos sao ate irresponsaveis,criando aberraçoes e soltando pelo mundo), estes sim devem ser cuidados por bons profissionais,…………(CERTOS PAIS CERTAS MAES CERTOS PROFISSIONAIS)

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