Saí pouco antes da luz acender, ainda sob os fortes aplausos que nós da plateia enviávamos calorosamente às duas atrizes no palco. Saí meio aplaudindo, meio enxugando as lágrimas, meio curvado carregando minha vergonha de homem crescido chorando feito criança. Havia terminando a leitura aberta da peça Aquário com Peixes de Franz Keppler.

Não sei o que me deu. Não sou de chorar para fora. Sou do tipo que chora, ri e conversa para dentro. Mas a história daquelas duas mulheres que se amavam, mas se separavam, daquele amor que ia acabando como se acaba o ar, me tocou profundamente.

Ninguém havia me enganado: desde a primeira cena, do primeiro ato, ficava claro que o amor delas iria acabar. Não era segredo: desde o primeiro momento, transpareciam no palco os últimos momentos da história das duas. E libertos da ansiedade de vê-las juntas para sempre, só cabia a nós, amar o tempo que mantinha a elas, próxima uma da outra.

“Porque é tão difícil isso? ” Me perguntei tentando acertar o botão que me levaria para meu andar. Porque era tão difícil aceitar que as histórias são simplesmente histórias que começam e se acabam? Porque a gente não aprende? A valorizar os meios, os durantes, os tempos juntos, as noites de quarta-feira. A gente perde tempo demais nessa de achar que teremos todo o tempo do mundo.

Porque simplesmente não aceitamos que amores nascem para se consumirem até a penúltima gota? Jamais a última, jamais a última. A gente devia mesmo aprender a amar pelo tempo que durar, aprender a crer pelo tempo que amor for a nossa fé cega e suficiente, aprender a gostar mesmo daquilo que não vai ser nosso para sempre. Exercício terrível de desapego logo com o maior de todos os nossos apegos.

A gente devia mesmo aceitar que todo amor que começa já avisa na primeira cena, no primeiro ato: ‘O que começa agora, como tudo na vida, vai terminar. Talvez pela própria vida, talvez no dia em que a luz que é dela se apagar. Aproveite o meio, onde está o recheio, onde dorme o sabor. Ame enquanto puder e se fortaleça disso para quando a dor do fim vier nos doer. Por favor, desliguem seus celulares: a peça já vai começar’. Começo, meio e fim.

Diego Engenho Novo

Escritor, publicitário e filho da dona Betânia. Criador do blog Palavra Crônica, vive em São Paulo de onde escreve sobre relacionamentos e cotidiano.

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