Aquele abraço que nos salva do fim do mundo

Por Eduardo Benesi

Todo abraço tem a calmaria da camomila e o sorriso de um Girassol. Não desconfie. Deixe que os peitos se encostem. Abraços neutralizam a dor que aponta rumo ao sul. O encontro dos corações é a mais linda das simbioses. “Só não vale economizar amor pra se proteger.”

Abraço desajeitado e brusco, de quem quer mãe e pai, porque um dia faltou toque. Espeta por fora e carece por dentro. Agarra o amor e não quer soltar, não pode soltar, carência hiperbólica. Nunca julguem alguém carente. Nem todos tiveram a cor vermelha do lápis de cor.

Abraço de fim de jogo. Aquele mal entendido daquela jogada em que uma inocente canela levou a pior. Inimigos. Um jura o outro de morte, mas o juiz apita pra encerrar. E pronto, abraço de “foi treta do jogo”, valeu, falou, zerou.

Abraço de quem não tinha uma palavra melhor. De quem não sabe o que dizer, e então abraça, dizendo muito de tudo aquilo que cala. Tem gente que não tem palavras pra dar e então abraça. Aceite quem não tem palavras, mas tem abraço. Aceite quem não tem palavra, mas tem um like.

Abraço de despedida. A gente sente o adeus, sem que algum profeta nos entregue. O coração nos avisa em um disparo incontrolável. A gente apenas sabe, sem ninguém dizer. Não existe adeus, existem últimos abraços . Por isso, sempre demore pra abraçar, garanto que não dói.

Abraço de aeroporto. Um aperto. Morte em avião é manchete de jornal, então venha cá antes de virar pecinhas de um quebra cabeça de carbono. Por via das dúvidas, me de um adeus preventivo, para caso você desparecer pelo mar e eu não te achar pelo azul estilhaçado.

Abraçaço. Coisa de Caetano. Deve ser da intensidade de gente que um dia não pode voltar e “dar um laço no espaço”. A saudade era um abraço faltando entre camisas florais. Abraçaço vem com exagero, quase que quebra as vértebras. Desmonta, despenteia, desmanteiga. Quem disse que a memória não é carente?

Tem gente que mente olhando nos olhos, mas um abraço nunca mente. A gente sempre percebe a temperatura , a gente sente tudo o que dentro tem. Até a mentira diz a verdade. Abraço é melhor do que lavar roupa suja. Ao invés de remoer o passado com listas e evidências, o abraço às vezes é o melhor “de agora em diante”.

A evidência está sempre por trás de um abraço. Quem dera pudéssemos enxergar a expressão facial de alguém que está nos abraçando. Ali mora o depois do olhar. Lindo é quem abraça de olhos fechados. Mas por trás de alguns abraços existem os piores olhares. Repare no rosto de quem abraça, é cinema puro, não há esconderijo.

Abraço é suco natural. Dizer eu te amo ás vezes é suco Tang sem mexer. Amor não é o que se diz, é o que se faz. Acredite no meu abraço, não no que prometo. Abraço é um bairro como o Bixiga. Abraço é uma cidade como Bruges. Abraço é um filme como “As vantagens de ser invisível”. Abraço é quando o céu promete não chover.  Abraço é uma música da Karen’O.

Eu nunca fui o melhor no futebol. Era sempre o penúltimo a ser escolhido. O último estava no banheiro. Mas, já fiz o gol da virada, em plena final. Ganhei troféu revelação. Eu nunca aprendi a dar cambalhota nem jogar truco. Eu nunca acreditei nesse papo de “a gente nunca esquece depois que aprende a andar de bicicleta”. Eu já me esqueci. Da turma, fui o último a beijar, fui criança até o último pé de amora. Eu só passei na minha terceira prova de auto-escola e do vestibular. Eu jamais acertei um número de dança, nem ganhei na loteria esportiva – jamais achei que Senegal venceria a França na Copa de 2002.

Quando brincava de super-herói, ficava sempre com o personagem que tinha menos poderes. Eu nunca enxerguei como alguém sem óculos. Seis graus de hipermetropia sempre me separaram diametralmente da realidade, até por isso nunca achava a letra E de Eduardo na sopa de letrinhas. Mas o melhor que eu tenho é o meu abraço. E mesmo que eu me esforce para ser o melhor em tudo, nada pra mim vai ser tão mágico quanto o meu empenho em abraçar com força e soprar pra longe qualquer dor que o outro tenha.

Quando tudo parece nada, quando o cometa nos parte em pedaços não coláveis, tudo o que precisamos é de uma piscina de bolinhas ou de um abraço que nos salve do fim do mundo.



LIVRO NOVO



Blog oficial da escritora Fabíola Simões que, em 2015, publicou seu primeiro livro: "A Soma de todos Afetos".

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